Guia prático para sobreviver às eleições de 2018
1
– Birra não ganha eleição
Aliás,
birra não ganha nada. A birra, por si só, já é uma derrota.
Espernear na defesa de um candidato contra todos os fatos e
argumentos lógicos que mostram que ele não é exatamente a melhor
alternativa é pura paixão. Então convém evitar discussões
“neutras” ou tentar impor suas preferências aos outros. Falando
nisso:
2
– Toda imposição é uma violência
Quando
o pessoal da Península Ibérica chegou nas “Américas” e impôs
seu european way of life e seu jeito de ver o mundo e, com isso, dizimou a
cultura, a ciência e os conhecimentos de povos milenares, o mundo
inteiro perdeu. Inclusive os próprios europeus. Querer impor
qualquer ideia ou comportamento num universo em que a dúvida é
traço de sabedoria é… bem, é no mínimo ausência de sabedoria.
3
– Sempre, às vezes, nunca
Sabe
a regra dos cotovelos à mesa? Pois bem, existe uma regra parecida
para debates e afins. Falar e ouvir, na mesma proporção, é sempre
bom. Iniciar um assunto de política, às vezes, pois depende da hora
e do lugar. Mas usar vocativos pouco respeitosos, nunca – e presta
atenção, nunca – é legal. Chamar o interlocutor de burro ou de
idiota pode parecer tentador em caso de discordância ideológica ou
política, mas, não importa o motivo, se isso acontecer, o errado
será você. E quem estará fazendo papel de idiota também.
4
– Armas químicas e poemas
Tem
uma música do Legião Urbana (e não do Engenheiros) que diz assim:
Existem
muitos formatos
Que
só têm verniz
E
não tem invenção
E
tudo aquilo contra o que sempre lutam
É
exatamente tudo aquilo que eles são
É
interessante, porque é algo que acontece com certa frequência. Quem
luta muito por uma causa, por vezes, a considera tão importante a
ponto de acreditar que os fins realmente justificam os meios. É um
vale tudo. Passa a lutar com as mesmas armas do adversário e com a
mesma coragem para tomar medidas drásticas e cruéis. Pela revolução
ou contra ela, não importa.
Isso
é incoerência. Porque as injustiças são todas iguais,
independentemente do que as motivou.
Obs:
só por curiosidade, na sequência da música, o Planeta Terra é
invadido por marcianos. Talvez faça sentido.
5
– Ser a favor e não contra
Porque
ser contrário a um movimento também é fazer parte dele, como disse
Pablo Picasso. É outra face da mesma moeda, para usar um clichê.
Quando se é contra, só se vai repetir o que já existe, o que já
foi feito e, provavelmente, deu errado. Só que, agora, ao contrário.
É como a mão direita que, no espelho, é a esquerda, ou o oposto. E
o exemplo com “direita” e “esquerda” não é coincidência.
Salvo
engano, na época do Império diziam que não tem nada mais parecido
com um conservador do que um liberal no poder. Bons tempos aqueles.
6
– 18+
Não
são nudes. É maturidade. Para certos tipos de discussão e de
argumentos, sobram poucas respostas, senão o choro ou o silêncio.
Dizer que seu candidato levou uma facada mas meu colega de partido
levou um tiro e ninguém se indignou é triste, bem triste.
Existem algumas fronteiras que existem para não ser ultrapassadas,
como a violência. Ou justificar violência com violência, como se
fosse uma discussão de crianças do primário.
Vale
o mesmo para desejar a morte do adversário (matá-lo, então, nem se
fala). Nesses casos, a democracia perde o sentido. E os gregos não
tiveram todo aquele trabalho para nada.
7 – Uma dose de bom senso e mais uma pra acompanhar
Se
o Tim Maia lendo, atingiu o bom senso, não é conosco que vai ser
diferente. Ler é muito importante. Acompanhar notícias, se
atualizar e se informar. Estudar como as coisas funcionam. E
depois duvidar de tudo o que aprendeu e começar de novo. Sem nunca
ter certeza absoluta de nada, o que, aliás, é um pleonasmo
horrível. Afinal, como dizia René Descartes, aquele francês teimoso que nos legou seu divertidíssimo plano cartesiano:
O
bom senso é a coisa do mundo mais bem distribuída: todos pensamos
tê-lo em tal medida que até os mais difíceis de contentar nas
outras coisas não costumam desejar mais bom senso do que aquele que
têm.
8 - Ponderar como se fosse um libriano
Não
é à toa que as eleições são em outubro, mês do signo de libra.
Tenho certeza que a Justiça Eleitoral pensou nisso ao definir essas
datas. É muito importante por tudo numa balança e ponderar os
prós e contras, ter ciência das vantagens de suas escolhas, mas
também do que será sacrificado por causa delas (porque algum
sacrifício haverá, não se iluda).
Mas,
quando chegar a hora, tenha um pouco mais de atitude do que a maioria
dos librianos. Vote, sem medo. Seu voto tem o mesmo valor do de
qualquer outra pessoa e a democracia existe para isso. Não se
esqueça dos gregos.
9 – Neutralidade é para sabonete
Se
tem uma coisa que quem viu o último episódio de Sense 8 aprendeu
foi que a neutralidade, em tempos de injustiça extrema, não é
neutralidade, mas cumplicidade. Não sei se chegamos ao ponto de
viver tempos assim, mas não estamos longe. Ao que parece, uma parte
das pessoas perdeu o medo de falar aberta e publicamente que certos
tipos de gente têm que morrer ou ser privada dos direitos mais
elementares: a liberdade, a busca pela felicidade e a possibilidade
de amar e constituir uma família. Além da própria vida, claro.
Nesses
casos, talvez seja importante se posicionar. Com respeito, claro, sem
esquecer os pontos anteriores.